Mobilizações policiais por melhorias nas condições salariais e de trabalho e paralisações ressurgiram pelo Brasil a sete meses da eleição presidencial. O recrudescimento dos movimentos das forças de segurança nos Estados deverá ter reflexo nas disputas deste ano. O Estadão identificou, até o momento, pelo menos 11 possíveis candidatos com origem nas polícias Civil e Militar e nas Forças Armadas nas eleições majoritárias – a governo do Estado e ao Senado.
A Região Nordeste tem a maior parte dos nomes (6), com destaque para o Ceará, onde Capitão Wagner (PROS) – que foi derrotado na disputa pela prefeitura de Fortaleza, em 2020, numa votação parelha – deverá se candidatar ao governo do Estado. A expectativa é de que Wagner polarize a eleição contra o candidato do grupo do PT/PDT, que terá o apoio do atual governador, Camilo Santana (PT).
No Estado, a outra candidatura policial é a do vereador de Fortaleza Inspetor Alberto (PROS), que deverá concorrer ao Senado. Ex-policial civil, Alberto é simpático à pauta bolsonarista, posa com ministros do governo em fotos e tem o apoio de líderes aliados ao Palácio do Planalto.
Em 2020, um motim de policiais militares no Ceará levou a episódios de violência – o senador e ex-governador Cid Gomes (PDT) foi atingido por dois tiros quando tentava invadir o 3.º Batalhão da PM em Sobral com uma retroescavadeira. Oito PMs foram excluídos da corporação e mais 351 policiais identificados como participantes do motim respondem a processos administrativos disciplinares.
O governador de Roraima, Coronel Marcos Rocha (PSL), é o único entre os ex-policiais que vai disputar a reeleição ao Executivo estadual. Além de Ceará e Roraima, candidaturas ligadas às forças de segurança e às Forças Armadas devem ser lançadas em Sergipe, Alagoas, Rio Grande do Norte, Espírito Santo, Goiás e Rio Grande do Sul – neste Estado, o atual vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, será candidato ao Senado pelo Republicanos.
É na categoria de ex-policiais, porém, que está a grande maioria das pré-candidaturas majoritárias. Vereador em Maceió, Delegado Fábio Costa quer se candidatar ao Senado. Para isso, deverá deixar o PSB. “Já fui bombeiro militar e agora sou delegado”, observou. “Estou tendo que dialogar com personagens da política para conseguir viabilizar.”
O presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, afirmou que 2018 representou um ponto de inflexão para a classe policial – que mantém olhos atentos à Câmara dos Deputados. “O lugar político de excelência das polícias até 2018 eram as Assembleias Legislativas, porque é onde está o dia a dia da agência da polícia”, disse Lima. Depois, segundo o pesquisador, “as associações perceberam que muitos dos obstáculos criados na modernização da gestão da segurança, das condições de trabalho, eram temas de pauta federal”.
Na avaliação de Lima, no Congresso é possível também defender uma agenda de costumes predominantemente conservadora. “Não é nenhuma novidade que policiais tenham uma aderência maior aos temas conservadores. É algo observado globalmente.”
De acordo com levantamento do 14.º Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 25.452 policiais e integrantes das Forças Armadas foram candidatos entre 2010 e 2020; 87,6% dos candidatos nas eleições de 2020 são vinculados a partidos de direita e centro-direita. Ainda segundo o estudo, até 2018, 1.860 foram eleitos, e, em toda a década, 94,5% dos candidatos eram homens. Nas eleições de 2018, 32 deputados federais e quatro senadores foram eleitos e passaram a compor a representação da categoria no Congresso.
O deputado Subtenente Gonzaga (PDT-MG) afirmou que a eleição do presidente Jair Bolsonaro, em 2018, impulsionou vitórias na Câmara dos Deputados e nas Assembleias Legislativas. Segundo ele, porém, a participação política dos policiais não está necessariamente atrelada a Bolsonaro. “A politização dos profissionais de segurança é um processo de organização da classe”, disse Gonzaga.
Nos últimos dois meses, houve movimentos de paralisação de forças da Polícia Civil ou Militar em pelo menos três Estados: Minas Gerais, Pernambuco e Rio Grande do Norte, com pressões intensas na Paraíba e em Sergipe.
Há uma semana, cerca de 30 mil manifestantes estiveram em assembleia-geral em Belo Horizonte e deflagraram paralisação policial no Estado – o movimento foi considerado “referência” por associações de praças da PM e por sindicatos da Polícia Civil pelo País.
Em Sergipe, uma mobilização que já durava mais de um ano indicava uma possível formação de greve estadual. Antes da realização da assembleia-geral que estava marcada para a quinta-feira passada, líderes do movimento se encontraram com Gonzaga, uma das principais vozes do movimento em Minas. Tanto em Sergipe como em Minas, os Tribunais de Justiça estaduais determinaram a impossibilidade de paralisação, com multa aos movimentos em caso de continuidade.
Legislação
Paralisações e protestos contra superiores são vedados pela lei a policiais e a bombeiros militares. De acordo com o regulamento, podem configurar motim.
Supremo
Em 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou que servidores que atuam na área da segurança pública (incluindo agentes civis) não podem entrar em greve.
Constituição
Em Minas Gerais, o próprio comandante-geral da PM, Rodrigo Sousa Rodrigues, deu aval à participação de policiais da ativa no protesto por reajuste salarial. A manifestação teve adesão até de policiais da ativa e armados. A Constituição proíbe atos com participantes armados.
Reflexo
Especialistas em segurança voltam a temer que o movimento em Minas reacenda a onda de motins no Brasil. Mobilizações de integrantes das forças de segurança também devem ter reflexo nas eleições, com candidaturas ligadas às polícias Civil e Militar e às Forças Armadas.