O PDT e o PSB vetaram a assinatura de cartas-compromisso com candidatos de grupos de renovação política para o pleito de 2022. De acordo com jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estabelecida em abril do ano passado, parlamentares que as assinam têm autonomia legislativa e não podem sofrer punições por votos contrários às orientações das siglas. Esse tipo de documento garantiu aos deputados federais Felipe Rigoni (União Brasil-ES) e Tabata Amaral (PSB-SP) o direito de trocar de legenda sem perder o mandato.
Associados ao movimento Acredito, que exigiu adesão à carta como condição para filiá-los nas eleições de 2018, ambos votaram a favor da reforma da Previdência, aprovada pelo Congresso no ano seguinte. Naquela época, seus partidos haviam fechado questão contra a proposta governista e impuseram sanções a eles por infidelidade partidária.
O presidente do PDT, Carlos Lupi, garantiu ao Estadão que a sigla não oferecerá mais oportunidades a membros de grupos de renovação. “Tomamos a decisão de não dar legenda a qualquer candidatura vinculada a grupos não partidários. Consideramos que candidaturas paralelas à estrutura partidária e com poderosos patrocinadores burlam flagrantemente a legislação eleitoral”, disse.
Para Tabata, a decisão beneficia caciques da legenda que se opõem à ascensão de novos quadros e às mudanças de políticas internas. “Na hora que o PDT se fecha para os grupos de renovação está dizendo que não aceita candidatos que não são do status quo. Não aceitam pessoas que fazem questionamento por mais transparência e mais democracia interna”, afirmou ela. “É válido eles terem essa postura, mas vão estar menos conectados com a sociedade.”
Presidente do PSB, Carlos Siqueira, descartou a possibilidade de aderir à carta para filiar candidatos: “Não vamos assinar mais nada. Essas pessoas deveriam lutar pelas candidaturas avulsas, assim poderiam fazer o que quisessem. Tenho muito respeito por eles, mas não aceitaremos mais. Na época, nos reunimos e expliquei que havia fechamento de questão e que todos deviam cumprir. Por isso, os suspendemos das atividades parlamentares por um ano”.
O entendimento a favor dos políticos signatários do acordo foi sedimentado no julgamento de uma ação movida por Rigoni e, posteriormente, aplicado no caso de Tabata, que, com a punição do PDT, perdeu o posto de vice-líder na Câmara e não pôde votar em assembleias ou ocupar assentos em comissões durante 90 dias.
O TSE considerou ainda que houve discriminação política pessoal contra os parlamentares. No caso da deputada, há um agravante: a senadora Kátia Abreu (Progressistas-TO), então filiada ao PDT, também desobedeceu a orientação, mas não sofreu punições nem foi alvo de críticas públicas de correligionários.
Principal liderança da sigla, o pré-candidato à Presidência Ciro Gomes afirmou, em 2019, que “não se pode servir a dois senhores”, ao opinar sobre a postura de Tabata na votação da reforma da Previdência. Também se referiu ao Acredito como “partido clandestino”.
No entanto, a carta-compromisso foi o fiel da balança, como indica o voto do presidente da Corte, o ministro do Supremo Tribunal Federal Luis Roberto Barroso na ação movida por Rigoni: “Entendo que a punição do requerente, em violação ao compromisso formal assumido, constitui grave discriminação política pessoal, caracterizadora de justa causa para a desfiliação partidária”.
O magistrado havia interrompido o julgamento com pedido de vistas em maio de 2020, quando o relator, ministro Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, votou pela improcedência da ação e extinção do processo, o que representaria derrota para os dissidentes.
O voto do ministro Sérgio Banhos no julgamento em que o TSE negou a declaração de justa causa para desfiliação do deputado federal Jefferson Alves (PSB-SP) do PSB também reforça a importância do documento na vitória dos membros do Acredito. “Esse caso difere totalmente dos ora julgados recentemente no presente feito: não há carta de compromisso, não há acordo entre atores políticos de ideologias notadamente antagônicas. As questões colocadas levam, na minha convicção, a não caracterização da justa causa em especial.”
Diante do aumento da resistência das siglas, o Acredito não exigirá, a partir deste ano, a assinatura de cartas-compromisso como pré-requisito à filiação de seus associados. Segundo o coordenador de mobilização da organização, Iuri Belmino, a partir de agora os associados devem tentar costurar acordos para garantir a independência dos mandatos. “Não tratamos mais a carta como um pré-requisito à filiação, mas espero que muitos candidatos consigam assiná-la com negociações internas”, disse Belmino.
Hoje pré-candidato ao governo do Espírito Santo, Rigoni não assinou carta-compromisso com seu atual partido, o União Brasil, e reconhece que os novatos terão mais dificuldades. “O fato de eu já ser conhecido pela minha atuação como parlamentar ajuda.” Tabata também não firmou acordo de independência com o PSB.