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Investigação e emoção: Como hospitais do CE localizam familiares de pacientes sem identificação

Há pessoas que não possuem nenhum registro na rede estadual de dados, demandando um verdadeiro trabalho de investigação.

Publicada em 01/07/24 às 04:53h - 45 visualizações

Marcos Moreira, DN


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Investigação e emoção: Como hospitais do CE localizam familiares de pacientes sem identificação
Além da identificação, Serviço Social também atua para reconectar pacientes com familiares  (Foto: Divulgação/Serviço Social da Casa de Cuidados do Ceará (CCC))
Imagine-se na situação de uma pessoa que foi socorrida após um Acidente Vascular Cerebral (AVC)sem acompanhante, documento ou registros na base de dados do Ceará, além de sequelas que a impedem de falar. Essa é a história do Carlos Antônio Gomes, de 53 anos, que é um entre as dezenas de pacientes sem identificação que chegam anualmente à rede pública de saúde.

Diante desses casos, o Serviço Social dos hospitais entra em ação. O trabalho envolve contato com outras unidades estaduais e secretarias municipais de Saúde e de Proteção Social, além de órgãos como os Centros de Referência de Assistência Social (Cras) e o Ministério Público do Ceará.

“No caso dos pacientes que chegam e não têm nenhuma identificação, a gente primeiramente busca a unidade que encaminhou. Se essa unidade tem algum contato de alguma referência, se já existia alguma coisa sobre o paciente, para a gente tentar pesquisar, no sentido de como começar a nossa intervenção”, diz Tinciane Oliveira, Coordenadora de Serviço Social do Hospital Regional do Sertão Central (HRSC), em Quixeramobim.

A operação torna-se mais complexa quando o paciente não consegue passar nenhuma informação. Em geral, a Perícia Forense do Estado do Ceará (Pefoce) é acionada para levantar dados que auxiliem na identificação, a partir da visita do papiloscopista ao hospital e coleta de digitais do paciente.

Como explica Jefferson Macêdo, assistente social e coordenador do Serviço Social do Hospital Regional do Cariri (HRC), a área tenta passar um descritivo dos pacientes dessa categoria para a Pefoce, com o máximo de informações possíveis, incluindo características corporais. A partir daí, entra o trabalho de coleta e análise das impressões digitais, palmares e plantares.

“A equipe da papiloscopia vem até o hospital e faz a coleta para ver se consta alguma coisa na base de dados do Ceará. Quando o paciente é do estado ou tem um RG já atualizado, esse trabalho fica mais fácil. E aí eles dão uma devolutiva em forma de ofício. Em duas ou três horas, a gente já tem o retorno dizendo se o paciente consta na base de dados ou não”, esclarece Macêdo.

Mesmo após a atuação da Pefoce, há pacientes que não possuem nenhum registro na rede estadual de dados, demandando um verdadeiro trabalho de “investigação”. Foi o que aconteceu com Carlos Antônio. 

NÃO IDENTIFICADO

Após sofrer um AVC, Carlos Antonio Gomes foi encaminhado do município de Barro, a mais de 300 quilômetros da Capital, para o HRC, em Juazeiro do Norte, na região do Cariri, em 3 de abril. Ele estava inconsciente e sem nenhum tipo de documento.

“Ele foi transferido e não tinha identificação. Oficiamos a cidade de Barro, onde não foi identificado nada dele lá. Solicitamos papiloscopia e não constava nada na base de dados. Houve uma melhora clínica dele, porém ele não conseguia verbalizar, mas ele conseguia gestos”, relata Jefferson Macêdo.

A partir daí, a equipe do Serviço Social começou um trabalho que se estendeu por vários dias com o paciente, que passou a afirmar ou negar informações com as mãos. O objetivo era identificar seu nome e a cidade de origem. Após uma série de tentativas, com nomes aleatórios, ele sinalizou positivamente para “Carlos”.

O mesmo método foi utilizado para descobrir o município dele. O primeiro passo nesse sentido foi entender que Carlos não era do Ceará, e sim da Paraíba. Depois de várias cidades paraibanas serem citadas, o paciente sinalizou de forma afirmativa para Cajazeiras.

Com o nome de Carlos e sua possível cidade, iniciou outra fase do trabalho, que envolveu o Serviço Social do HRC, a Pefoce e o Instituto de Polícia Científica da Paraíba (IPC/PB). Então, o órgão paraibano informou o nome completo e de onde ele era, o que permitiu a articulação do reencontro entre o paciente e seus familiares.

REENCONTRO

“Voltamos ao leito dele e dando as informações ele chegou a chorar, emocionado. Ele não conseguiu verbalizar, mas ele estava consciente, orientado e conseguia expressar através de gestos. Começamos a entrar em contato com o pessoal de Marizópolis [na Paraíba], que é a cidade de origem dele. Rapidinho, a gente conseguiu contato com a Secretaria de Saúde, com Assistência Social, e a gente conseguiu a família dele, que no caso a genitora e uma tia vieram para reconhecê-lo e dar seguimento à alta”, afirma o assistente social da unidade do Cariri.

A mãe Olindrina Gomes e a tia Maria Auxiliadora Gomes chegaram ao HRC depois de 48 dias de internação de Carlos. O paraibano havia saído de Marizópolis para buscar emprego no município de Coremas, também na Paraíba, mas estava há cerca de quatro meses sem dar notícias aos familiares.

Isso fez com que Olindrina perdesse as esperanças de revê-lo. Ao encontrar o filho, ela não conteve a emoção. “Agora eu tô me sentindo bem feliz, aliviada demais. Agradeço muito a todos que cuidaram tão bem dele”, comentou a mãe de Carlos, no dia do reencontro. 

CONEXÃO COM A FAMÍLIA

Tinciane Medeiros explica que o Serviço Social também atua para reaproximar famílias que tiveram laços fragilizados. Ela lembra o caso de um homem que estava há 40 anos em situação de rua. Ele chegou à unidade de saúde em estado crítico e sem documentação. A equipe teve que aguardar a melhora clínica dele para iniciar a intervenção, que buscou promover o reencontro com familiares.

“É um sentimento de dever cumprido, no sentido de que a gente conseguiu intermediar e localizar com poucas informações que a gente tinha e foi em busca da nossa rede de apoio. Apesar de muitas vezes essas pessoas terem vínculos fragilizados com seus familiares, nesse momento de enfermidade, a gente consegue muitas vezes aproximar”, defende a gestora do Serviço Social do HRC.

Outro exemplo desse tipo de trabalho vem do Serviço Social da Casa de Cuidados do Ceará (CCC), que atua por meio de escuta qualificada, orientações acerca dos direitos sociais, gestão de conflitos, reuniões e suporte a familiares. “Mais da metade dos pacientes atendidos pela CCC encontra-se em vulnerabilidade social ou em situação de risco, com vínculos fragilizados ou rompidos com suas famílias”, explica a assistente social Gilda Cavalcante.

CIDADANIA

No Hospital Geral Dr. Waldemar Alcântara (HGWA), em Messejana, 11 pacientes sem nenhum tipo de identificação foram auxiliados somente em 2023.

“Até o momento, tivemos sucesso em quase todos os casos. Outro detalhe, muitas vezes o paciente sem identificação vivia em situação de rua e quando identificado, não detém os documentos, daí, começa o outro trabalho de solicitação de emissão dos documentos junto à Receita Federal, ao Tribunal Regional Eleitoral e ao Caminhão do Cidadão da Secretaria de Proteção Social do estado do Ceará. Os documentos são fundamentais para garantir a cidadania do paciente, além de serem necessários para a inserção em programas e benefícios sociais”, diz Sâmia Bessa, assistente social do HCWA.




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