Os talibãs quase chegaram às portas de Cabul nesta sexta-feira (13), continuando seu avanço incontrolável no Afeganistão, onde vários países, como os Estados Unidos, vão evacuar seus diplomatas e cidadãos.
Em questão de dias, o governo afegão perdeu o controle da maior parte do país e os insurgentes controlam quase metade das capitais de província, a maior parte tomadas em apenas uma semana.
Nesta sexta, os talibãs se apoderaram facilmente de Firozkoh, capital da província de Ghor, e de Pul-i-Alam, capital da província de Logar, a apenas 50 km de Cabul.
"Os talibãs controlam (...) 100% (da cidade) e não há mais combates", disse à AFP uma autoridade local, Said Qaribullah Sadat.
Horas antes, os insurgentes comemoraram a queda de Lashkar Gah (sul), capital da província de Helmand, após capturar Kandahar, situada 150 km a leste, e Herat (oeste), respectivamente a segunda e a terceira cidades do Afeganistão.
"Leão de Herat" se rende
Praticamente todo o norte, o oeste e o sul do Afeganistão estão sob o controle dos talibãs. Cabul, Mazar-i-Sharif, a grande cidade do norte, e Jalalabad, a leste, são as três grandes cidades que o governo continua controlando.
Em Herat, estratégica por ficar próxima ao Irã, uma imagem reveladora descreve o que está acontecendo: Ismail Khan, apelidado de "o leão de Herat", peso pesado da região e um dos mais importantes guerreiros contra os talibãs teve que se render aos insurgentes.
Os talibãs iniciaram sua ofensiva em maio, quando o presidente americano, Joe Biden, confirmou que as tropas estrangeiras deixariam o país, 20 anos depois do início da intervenção dos Estados Unidos para tirar do poder os talibãs, que se negavam a entregar Osama bin Laden, líder da Al Qaeda, após os atentados de 11 de setembro de 2001.
A retirada das tropas estrangeiras terminará em 31 de agosto. Apesar do que acontece no Afeganistão, Biden afirmou que não lamenta sua decisão, embora seja certo que as autoridades americanas não escondem sua decepção diante da rapidez com que o exército afegão se evapora diante do avanço dos talibãs.
Os Estados Unidos gastaram mais de um trilhão de dólares em 20 anos para formar e equipar o exército afegão.
"Não é um abandono"
Diante da situação, os Estados Unidos decidiram "reduzir ainda mais" sua "presença diplomática" em Cabul "nas próximas semanas", anunciou o porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price.
"Não é um abandono", garantiu.
Para realizar esta operação, ele mobilizará 3.000 soldados no aeroporto de Cabul, que vão se somar aos 650 soldados ainda presentes no país, segundo o porta-voz do Pentágono, John Kirby. Outros 3.500 militares estarão no Kuwait para ser enviados como reforço caso a situação se deteriore.
Nesta sexta, Kirby informou que a maior parte das tropas chegará a Cabul antes da segunda-feira e que os Estados Unidos estavam prontos para evacuar por ar "milhares de pessoas por dia", embora tenha considerado que a capital afegão não enfrenta nenhuma "ameaça iminente".
Paralelamente, o Reino Unido anunciou que 600 militares vão ajudar seus cidadãos a sairem do Afeganistão.
O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, afirmou que seu país "não vai virar as costas ao Afeganistão" e que prevê "fazer pressão" pela via diplomática e política, ao descarar, por enquanto, a hipótese de uma "solução militar".
Vários países ocidentais, como Holanda, Suécia, Itália e Espanha decidiram reduzir ao mínimo o pessoal de suas embaixadas e anunciaram a repatriação de funcionários afegãos. A Alemanha também vai reduzir seu pessoal "ao mínimo absoluto".
Outros, como a Noruega e a Dinamarca, fecharam temporariamente suas delegações. E a Suíça, que não tem embaixada no país, anunciou a repatriação de uma dezena de colaboradores suíços e 40 funcionários locais.
A Otan anunciou, por sua vez, que vai apoiar o governo afegão "o máximo que puder", segundo seu secretário-geral, Jens Stoltenberg, após uma reunião com os embaixadores da Aliança em Bruxelas.
Proposta do governo
Enquanto os talibãs continuam ganhando terreno no Afeganistão, no âmbito diplomático tentava-se em vão chegar um acordo em Doha, no Catar.
As negociações terminaram na quinta-feira sem avanços significativos e, em uma declaração comum, os Estados Unidos, o Paquistão, a União Europeia e a China afirmaram que não vão reconhecer nenhum governo afegão que se "imponha pela força".
Na quinta, o executivo afegão propôs "aos talibãs uma distribuição de poder em troca do fim da violência", uma ideia até agora rejeitada pelo presidente afegão, Ashraf Ghani, e que poderia não interessar em absoluto aos talibãs, em vista de seu avanço.
"Estou profundamente preocupado com os primeiros indícios de que os talibãs estão impondo restrições severas aos direitos humanos nas áreas sob seu controle, especialmente a mulheres e jornalistas", disse nesta sexta o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres.
"A mensagem da comunidade internacional para aqueles em pé de guerra deve ser clara: tomar o poder por meio da força militar é uma proposta perdida. Isso só pode levar a uma guerra civil prolongada ou ao isolamento completo do Afeganistão", afirmou Guterres.
Os americanos assinaram em fevereiro de 2020 um acordo com os talibãs que incluía a retirada das tropas estrangeiras em troca de garantias na área da segurança.
Os enfrentamentos têm um custo terrível para a população civil. Em um mês, pelo menos 183 civis, entre eles crianças, morreram em Lashkar Gah, Kandahar, Herat (oeste) e Kunduz, e 250.000 pessoas foram deslocadas pelo conflito desde o fim de maio.
Oitenta por cento dos que tiveram que deixar suas casas são mulheres e crianças, segundo a ONU, que estima que o número total no país chegue a 400.000.