Como era de esperar, as declarações de Silveira geraram reação no mercado e derrubaram as ações da Petrobras. O recuo foi parcialmente contido quando a empresa divulgou um comunicado em que não apenas negou ter recebido qualquer proposta para mudar o PPI, como cobrou do governo que a apresentasse formalmente. No mesmo dia, Silveira assegurou que isso não afetaria a rentabilidade da companhia e frisou que as mudanças seriam discutidas somente após a posse dos novos membros do Conselho de Administração, o que daria mais equilíbrio entre a visão da União, representada no colegiado, e a da diretoria nomeada pelo presidente da empresa, o ex-senador Jean Paul Prates.
A política de PPI foi adotada pela Petrobras em 2016, após anos de controle artificial dos preços dos combustíveis, prática adotada ao longo dos governos petistas. Basicamente, ela proíbe a companhia de praticar preços abaixo daqueles que uma empresa privada aplicaria ao importar gasolina e diesel para revender no País. A política reverteu os prejuízos bilionários que a companhia registrou, mas a frequência dos reajustes passou por mudanças nos últimos anos. Já foi diária, quinzenal e mensal, até perder periodicidade fixa mais recentemente.
Se deu liberdade para a companhia reduzir a volatilidade dos preços ao consumidor, a falta de um cronograma também reduziu o grau de transparência das decisões e abriu espaço para o retorno de interferências políticas. Exemplo disso é que em junho do ano passado, em meio à campanha eleitoral e sob pressão de Jair Bolsonaro, a Petrobras ficou quase 100 dias sem anunciar aumentos, apesar de acumular uma defasagem de quase 20% em relação aos preços internacionais. Isso só mostra que o cumprimento da regra não depende dos mecanismos para segui-la, mas da real disposição do governo em respeitá-la.
Não é segredo para ninguém a intenção do governo Lula de “abrasileirar” os preços dos combustíveis, tema que já havia sido explorado em sua campanha. A dúvida – e o verdadeiro pano de fundo dessa disputa – é quem vai pagar o custo astronômico dessa diretriz: a Petrobras, por meio de seu caixa, ou o governo, por meio de um fundo de estabilização de preços.
É legítimo que o governo queira reavaliar a política de preços da Petrobras, mas a maneira como isso tem sido feito não tem nada de auspiciosa. Mais do que divergências de ponto de vista ou mero atabalhoamento, ela revela um método que Lula da Silva rotineiramente costuma adotar: incentivar, nos bastidores, aliados a brigarem publicamente, aguardar para ver quem sobrevive e, por fim, arbitrar a disputa.
Em café da manhã com jornalistas, um dia depois do alvoroço a respeito da Petrobras, o presidente disse ter sido “pego de surpresa” na discussão entre Silveira e Prates. “A política de preços da Petrobras será discutida pelo governo no momento em que o presidente da República convocar o governo para discutir. Enquanto o presidente da República não convocar, a gente não vai mudar o que está funcionando hoje”, afirmou o petista.
Essa prática já foi adotada por Lula antes da apresentação do arcabouço fiscal, opondo, de um lado, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad; e do outro, o ministro da Casa Civil, Rui Costa; e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann. Enquanto Lula se diverte testando sua força, todos os demais pagam o preço. Quando é apenas um ministro ou um presidente de uma companhia, os danos ficam mais contidos. O problema é quando a Petrobras, o País e a sociedade também têm de arcar com esses custo.