A proposta, que deve ser apresentada até setembro à Câmara dos Deputados, é uma medida da gestão petista para retomar o financiamento dos sindicatos, após o fim do imposto sindical obrigatório com a Reforma Trabalhista do governo do ex-presidente Michel Temer (MDB), em 2017.
A retomada da contribuição esteve em pauta desde a campanha eleitoral. Lula se comprometeu com as centrais a recriar um sistema para abastecer os cofres das entidades. Além disso, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, passou o primeiro semestre inteiro criticando o fim do imposto e a reforma trabalhista pela "asfixia financeira" dos sindicatos.
Um estudo feito pelo Departamento Intersindical de Estatística (Dieese) mostrou que a arrecadação dos sindicatos teve uma queda de 98% após a reforma, passando de R$ 3,6 bilhões, em 2017, para R$ 68 milhões em 2023.
Em contrapartida, a deputada federal Any Ortiz (Cidadania-RS) classificou o projeto do governo como grande retrocesso. Segundo ela, haverá uma mobilização intensa caso o Executivo insista na apresentação do texto.
"A queda da arrecadação permite dizer que o trabalhador não se sentia representado pelos sindicatos que hoje são totalmente aparelhados e braço do PT", afirmou a deputada.
O senador Rogério Marinho, que foi relator da Reforma Trabalhista e o líder da oposição no Senado, foi ainda mais duro e criticou a proposta por meio das redes sociais. "Os pelegos que tiveram a subtração do famigerado imposto sindical obrigatório, com a reforma trabalhista, voltam com força total na agenda de retrocessos do PT. Vamos estar vigilantes para evitar mais essa apropriação do salário do trabalhador brasileiro", disse Marinho.
Segundo a proposta, a nova taxa seria vinculada a acordos de reajuste salarial intermediados pelos sindicatos e limitada a até 1% do rendimento anual do trabalhador, a ser deduzida diretamente do salário, inclusive dos não sindicalizados. Isso significa um valor de até três dias e meio de trabalho, segundo especialistas. Dois terços do valor arrecadado seriam destinados aos sindicatos, e o restante distribuído entre confederações trabalhistas.
Toda vez que houver negociações sobre reajustes salariais e outros benefícios, um dos pontos a serem definidos será a contribuição sindical. Isso significa que os reajustes salariais só estarão garantidos quando o valor de contribuição sindical para aquela rodada de debates for aceito pelos trabalhadores.
O argumento do governo é que o financiamento é essencial para o trabalho de base das entidades e que não se trata mais de imposto compulsório, mas negociado em assembleia.
"Se o sindicato está prestando um serviço, possibilitando um aumento salarial, é justo que o trabalhador não sindicalizado pague a contribuição. Se ele não aceitar pagar a taxa, é só ir à assembleia e votar contra", afirmou o ministro do Trabalho ao jornalO Globo.
A principal preocupação que o Congresso deve ter na apreciação do projeto, segundo José Pastore, professor da FEA-USP, é com o super fortalecimento das entidades sindicais, que hoje têm monopólio de negociação. "Pela legislação atual, os sindicatos têm o poder de negociar, fixar valores e até para definir os critérios de direito à oposição".
Segundo ele, os sindicatos normalmente dificultam ao máximo o processo de requerimento de isenção aos trabalhadores que não concordam com a taxação. "Pedem carta assinada, a ser protocolada pessoalmente em dia e hora marcadas, muitas vezes em assembleias, para constranger os opositores entre os demais sindicalizados", afirma.
Há outro ponto problemático. Para Pastore, a contribuição não pode servir como "chantagem" para o recebimento dos benefícios das negociações com as entidades patronais. "Você não pode atrelar uma coisa a outra, porque a lei não permite outra esfera de negociação, a não ser o sindicato da categoria".
Fundamental, segundo o professor, seria abolir a unicidade sindical para possibilitar a competição entre os representantes das categorias. O fim da unicidade, no entanto, só pode ser determinado por meio de uma Proposta de Emenda Parlamentar à Constituição (PEC). "A discussão deveria começar por aí, não pelo projeto de lei. Mas o Brasil é sempre o país do 'puxadinho'", sintetiza Pastore.
Para Thiago Collodel, sócio coordenador da Araúz Advogados, na forma como está desenhado, trata-se de um imposto obrigatório, semelhante ao extinto, já que não está garantido o direito de oposição. Ou seja, os trabalhadores que não concordarem não têm a opção de não recolher.
Segundo ele, por ocasião da reforma, um dos pontos mais elogiados foi o fim da compulsoriedade. "Era uma forma de obrigar os sindicatos a fazerem seu dever de casa e se tornarem representativos. "Da forma como está, além de retrocesso, o projeto fere a princípio da irredutibilidade dos salários, assegurada pela Constituição".
Pastore concorda com a necessidade de se estabelecer o direito à oposição. Também é necessário, para ele, regulamentar a participação de não sindicalizados nas assembleias com o poder de voto, já que, pela proposta, eles também serão cobrados.